Fagulha de Luz



Há meses, um bloqueio insano me consome. Há meses.
E a cada segundo que passa é como uma torrente de emoções, como se eu estivesse numa estrada muito longa, muito árdua, a caminho do lar. Quase ofegante, quase desistente. Mas, não. Desistir não é a solução.
Medos, ansiedades, decisões, angústias, silêncios provocados, sofrimentos isolados, sentimentos de não pertencimento, porém, é uma miragem provocada por esse sol escaldante sobre o qual caminhei até aqui. Continuo caminhando, sozinha e desnorteada, sabendo que mesmo desejando, desistir não é a minha solução.
Quantas madrugadas eu gastei pensando nas mais inusitadas possibilidades de cenário feliz, e quantas vezes me frustrei por esses pensamentos não se realizarem. Claro, pensamentos não são mágicos. Palavras são. Palavras tem poder, as vezes de fazer nascer, as vezes de fazer morrer. Uma morte lenta e dolorida, cheia de comiseração e culpa. Coitados de nós, humanos, sem saber para onde ir, pegamos qualquer esquina. E as dúvidas nos acompanham, como sombras curiosas.
Desistir é uma palavra doce se você só tem experimentado amarguras. Daí surge o desejo, mas não, não é minha solução, não vale o esforço que eu já tive pra chegar até aqui. Foi uma luta ferrenha, quase improvável para minha fragilidade corriqueira. Mesmo assim, consegui enxergar alguma luz, e gostei tanto dela que a esperei aumentar, até cegar meus olhos e eu finalmente entender o que as pessoas por quem passei diziam pra mim. "Vai ficar tudo bem". Estava escrito em quase todos os olhos penosos diante de mim. 
É importante lhe dizer que não vi a luz sozinha, na verdade alguém que passou por mim, disse que ela estava à minha frente. Esfreguei os olhos, os espremi um pouco, foquei, e lá estava ela, quase invisível pra mim, mas existente. Percebi depois de já me sentir melhor, que ela sempre estivera ali, mas eu esperei algo grandioso demais, quase um outdoor me dizendo o que fazer. Enganei-me demais. As coisas pequenas também são luz. Também podem fazer valer o meu esforço. A gentileza de uns poucos fez valer o desgaste que vivi caminhando naquela estrada muito longa. Nunca vi as coisas claras como hoje, mas me ajudaram a enxergar mesmo quando parece que elas não estão lá. Tal qual o sol, que mesmo em dias nublados dá o "ar de sua graça" em formato de raios solares.
As vezes eu passei por pessoas que não se importaram, elas foram muitas, mas também passei por aquelas que me ofereceram uma mão. E o que eu fiz? Ignorei a mão da pessoa, como quem acha que é "bom demais pra ser verdade". Me arrependi, mas segui, sozinha como tinha já o hábito de ser. É que é difícil acreditar na bondade, quando muito do mundo hoje é medo e comodismo. Mas se a bondade não existisse mais, será que eu estaria assim infeliz? Talvez a evolução fosse a habituação a ausência dela. Portanto, pressuponho que existem fagulhas desse elemento no mundo. Fagulhas espalhadas, mas não inexistentes. No olhar de uma criança reside um vislumbre dócil dessa característica, apesar também das travessuras imaginadas (rs).
Eu me fiz uma ilha, uma ilha que ninguém tem acesso. E foi na ilha que vi a estrada, e daí comecei a trilhá-la. O sol era escaldante, meus pensamentos enegreceram com a dificuldade de chegar ao final do trajeto. Mas comecei a enxergar que não era a única, que haviam dezenas, talvez centenas ou milhares de pessoas como eu. Me agarrei a crer em uma, e essa foi suficiente para me mostrar a fagulha de luz/bondade. Ela me ajudou a garimpar o ouro que é o desejo de continuar. Por isso eu sei que desistir não é uma solução, porque eu tentei, e tentando eu vi que desistir era só um atalho para o fim de valiosas possibilidades. Era o fim, não da minha dor, mas da possibilidade de deixar minha marquinha no mundo, da possibilidade de ser finalmente feliz.
Há meses tenho um bloqueio insano. Há meses. E ainda não sei porque palavras nasceram de um súbito insight, mas como a pessoa que me mostrou a fagulha de luz sabe bem, talvez esteja eu sendo uma fagulha de luz para outro alguém. E isso me consola, porque por mais árdua que seja a caminhada, ela não é despropositada, mesmo que eu no ápice da dor não veja sentido em nada. 
Continue, olhe nos olhos de alguém, acredite na fagulha de luz, não espere muito para se agarrar à vida, apenas seja você e permita. Porque não, desistir não é uma solução.


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