Cegueira



Todos os dias, pessoas param para se enxergar, isso é natural. Elas vêm a si mesmas e mensuram o que necessitam ou não, pois sabemos nos adaptar a tudo, inclusive às nossas cegueiras adquiridas por influência geracional. Esse é o problema.
Vive-se num mundo onde não enxergamos o outro, onde há o costume "fajuto" de enxergar só o que nos convém. Sofro desse mal, mas estou tentando me vacinar de alguma forma, pois esse hábito cansa. Por mais que as pessoas sejam feitas da mesma matéria, possuam os mesmos elementos ou até compartilhem ideias semelhantes sobre alguns aspectos, todo o resto é diferente. Mas a gente repete as impressões... Repete demais. Olhamos com olhos que captam "estranhos" e os elencamos, deixando-os de lado ou sequer damo-lhes a possibilidade da segunda chance no desenvolver de uma relação. O que é estranho em você que eu não tenho? Talvez algumas coisas, e isso poderia deixar de ser um problema, pois a estranheza do outro é a nossa "normalidade" cotidiana. 
Cansa ver situações em que escolhemos os outros por aquilo que de correto aparentam. Pessoas estranhas são corajosas e isso vale muito a pena ver. Elas brigam diariamente por um lugar ao sol, talvez querendo deixar o rótulo aos olhos de tantos que os rotularam ao longo do tempo. É uma tortura gigantesca deixar de ser quem se é, para ser quem se espera ser. Não falo de melhorias, elas são necessárias, muito. Mas há uma parte, um fragmento, que é elementar em nós. Nossa identidade, nosso jeito de estar no mundo, de falar, andar, pensar, sonhar, sorrir, abraçar, oferecer carinho... Tudo é singular, mas a cegueira da pós-modernidade não nos deixa ver.
Quando vejo que enxergo nas pessoas as mesmas coisas, começo a me analisar, ver se não sou eu que estou sendo simplória. E geralmente essa é a verdade que encontro. No outro existe bem mais que um jeito "diferente" de agir, existe uma lógica diferenciada, existe uma cosmovisão distinta, uma maneira de ver a vida que não temos acesso por falta de experiência. Viver com isso é bem difícil à medida em que só temos uma vida, e temos de conviver com as pessoas em suas respectivas vidas, que acontecem simultâneas às nossas. Se houvesse um meio da empatia ser completa seria perfeito, como se fossemos adentrar por alguns minutos na mente do outro, como que para sentir o que ele sente, talvez compreendê-lo em sua plenitude. Mas isso é utopia, além de qualquer possibilidade humana. Pode-se apenas continuar tentando ser mais gentil, nesse mundo de olhos rotuladores, que são cegos pro belo, pois vêm tudo embaçado ou feio, pois é só isso o que eles conseguem enxergar.
Mas e aí, o que fazer quando não há soluções ou curas mágicas pra nossa cegueira? Simplesmente viver e continuar tentando tatear as coisas. Se não há olhos bons, tenta-se com os outros sentidos. O coração pode ser um aliado, mas cuidado! ele costuma ser meio burrinho, então concentre sua atenção em todos os sentidos possíveis. Aprecie os outros, aprecie os "normais", os "estranhos", os deslocados, os populares... Cada um pode ter algo bom pra mostrar, e se não tiver, paciência! bola pra frente, que há mais pessoas na terra que sua capacidade de contar.
A grande questão agora é você se perceber enquanto cego, como eu estou fazendo, como muitos antes de mim já tentaram. O seu jeito é seu porque sua história fez ele acontecer, então, conte essa história para as pessoas que se interessarem. Se não houver interessados, simples, conte para as estrelas. No fim, todos somos estranhos, cegos e estranhos.

Comentários

Postar um comentário